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Opinião

Crônica em retalhos: não adianta gritar

30 outubro 2010 - 13h50Por Wilson Valentim Biasotto

Vela e tição: antigamente, isso menos que cem anos atrás, costumava-se colocar uma vela acessa entre as mãos dos moribundos que era para iluminar-lhes o caminho do céu.  E não é que num sítio distante um velho estava nas últimas e não se achava uma única vela na casa? Então o filho mais esperto correu até o fogão, catou um tição, reavivou a chama e colocou entre as mãos do pai, que exclamou: “morrendo e aprendendo”. Quer dizer, quando não tem vela até um tição aceso serve.

Velhos sábios: esse “morrendo e aprendendo” demonstra que mesmo tendo acumulado grande experiência de vida, devemos estar conscientes de que a velhice, por si só, não traz a sabedoria. Se trouxesse seria fácil resolver todos os problemas, inclusive os políticos, pois haveríamos de fazer uma Lei prevendo que somente os velhos votariam.

Os jovens: de 1964 a 1985 os eleitores não escolhiam o presidente devido a abominável ditadura militar, hoje todos jovens acima de 16 anos podem votar, do que se depreende que eles já têm consciência do que é melhor para o país.

A democracia: Assim como na vida, no regime democrático o aprendizado também é continuado. As rupturas causam a castração das lideranças, principalmente as lideranças estudantis. Portanto, aos jovens de 16 anos foi aberta, desde a Constituição de 1988, uma grandiosa escola de aprendizado que se continuar ao longo de suas vidas, com certeza, aprimorará cada vez mais o nível eleitoral brasileiro.

Ver para crer: Minha avó dizia “San Tommaso non crede finché non attacca il suo naso”, quer dizer, São Tomé, não crê enquanto não mete o nariz. Ou, em outras palavras, “ é ver para crer”.

Desejo ver: particularmente eu, que só votei para presidente quando tinha quase 40 anos, quero aproveitar os anos de vida que me restam para votar bastante, e não somente para presidente. Quero ver a convocação de novas eleições para Dourados e somente então vou crer que a nossa Constituição não permite mais o casuísmo. Meu desejo é que os jovens não pensem que tudo não passa de uma farsa.

Tem gente contra: Lamentável é detectar que não somente os golpistas desejam que não haja eleições, pessoas bem intencionadas também . Um amigo meu confessou-me que se tiver eleição para prefeito em Dourados ele não vai mais votar. Segundo ele a sua obrigação já tinha sido feita: “agora que se dane”. Não concordei mas calei-me.

Tem cada idéia: Outro amigo confessou-me que votou para o Serra, mas que no segundo turno vai votar para a Dilma. Estranhei tão radical mudança, mas ele me explicou, se o homem corre fazer uma tomografia por causa de uma bolinha de papel atirada em sua cabeça, como vai suportar nos ombros o peso de administrar o Brasil? E concluiu, não é à toa que o Serra sempre desiste de tudo o que começa.

A coisa tá ruça: Isso mesmo ruça, com ç, quer dizer feia, ao menos em termos de previssões. Não é que o nosso glorioso repórter policial o Waldemar Russo profetizou em artigo dessa semana que a Dilma será o Artuzi do Brasil? O argumento do Russo é que ela vai seguir as determinações do Lula. Ora, se o Ari tivesse seguido os mesmos passos de Lula Dourados não estaria muito melhor?

Não adianta gritar: não adianta gritar para os surdos. Lendo “As cidades Invisíveis” de Ítalo Calvino aprendi que “quem comanda a narrativa são os ouvidos”. Portanto não adianta gritar. As pessoas separam da narrativa, por mais longa e bem articulada que seja, apenas aquilo que elas realmente desejam ouvir.

Experiência prática:  Agora que minha sogra - aos 80 anos e sendo surda - após enviuvar veio morar conosco, eu me convenci radicalmente de que não adianta gritar. Compreendi que basta me  dirigir à sua frente e falar compassadamente, mesmo que baixinho, para que ela, lendo os meus lábios, me entenda melhor do que se eu gritasse ao seu ouvido.

Em sala de aula: Eu já tinha boa experiência como professor. Se uma classe está muito barulhenta, não adianta gritar. Ela não está interessada e pronto. Compensa mudar o jeito de atuar. Talvez mudando o método ou até mesmo falando baixinho para que os interessados leiam os nossos lábios.

Nas eleições: também não adianta gritar. Basta entendermos que somos muito mais importantes do que às vezes imaginamos. Nosso voto, somado aos 137 milhões de votos de outros brasileiros, no dia 31 de outubro, decidirá os destinos de nosso país. E nem me refiro à venda de voto, que é o mesmo que vender um pedacinho da própria Pátria. Refiro-me à nossa responsabilidade em pesar o que é melhor para o Brasil, o que é melhor para manter o emprego de nossos filhos e a esperança de que sejam felizes.

 

Suas críticas são bem vindas: [email protected]

* Membro da Academia Douradense de Letras; aposentou-se como professor titular pelo CEUD/UFMS, onde, além do magistério e desenvolvimento de projetos de pesquisas, ocupou cargos de chefia e direção.