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Opinião

Equívoco do discurso de extinção da Justiça do Trabalho

05 janeiro 2019 - 13h07Por Francisco das C. Lima Filho

Novamente, e agora pela autorizada voz do Senhor Presidente da República, se volta a defender a extinção da Justiça do Trabalho, como se ela fosse a culpada pelo grave problema do desemprego que, como sabemos, é fruto de uma das mais graves crises econômicas, política e moral em que o pais mergulhou a partir de 2014.

Aqueles que defendem a tese da extinção, agora afirmada pelo mais alto mandatário da República, certamente estão esquecidos da importância social e até mesmo política da Justiça do Trabalho e dos relevantíssimos serviços que ela tem prestado à sociedade desde sua criação há mais de setenta anos, na concretização dos valores sociais do trabalho, direito fundamental constitucionalmente garantido pelos artigos 1º, inciso IV e 6º da Carta de 1988, representando mesmo um dos fundamentos e pilares da República e do modelo de Estado Democrático de Direito adotado pelo constituinte originário e que, por essa razão, constitui cláusula pétrea insucessível de eliminação por emenda constitucional (art. 60, inciso III, § 4º, inciso IV).

De fato, o Direito do Trabalho não é nem pode ser considerado uma dádiva do Estado, do Poder; antes, é fruto de lutas e conquistas históricas da classe trabalhadora e também dos empresários, que lutaram na década de 40 e ainda continuam lutando, por melhores condições vida e de trabalho.

Desse modo, não pode nem vai ser destruído pela vontade de alguns detentores episódicos do Poder por mais autorizados que possam ser, apenas porque as decisões da Justiça do Trabalho, criada como instrumento de pacificação social e de equilíbrio das relações de trabalho, marcadas pela desigualdade material, possam em determinados casos não agradar a este ou àquele que delas seja destinatário, pois isso decorre da própria finalidade dos órgãos do Poder Judiciário que nem sempre agradam a todos o que, aliás, é inerente ao regime democrático de direito, acolhido pelo poder constituinte originário de 1988.

Vive-se no Brasil o início de um governo que inspira esperança e promete combate à corrupção, desenvolvimento, trabalho, renda e emprego para milhares de brasileiros desempregados, o que, com todo respeito, é totalmente incompatível com a surpreendente fala presidencial de que a Justiça do Trabalho poderia ser extinta, o que mereceu por parte das Associações Nacionais de Magistrados e até mesmo da Associação Latinoasmericana de Juízes do Trabalho, notas públicas de contestação do que cogitado pelo Presidente da República, a evidenciar o equívoco de uma proposta de extinção desse órgão do Poder Judiciário.

Deveras, num pais de desempregados, de enormes desigualdades sociais e mesmo de miséria, a Justiça do Trabalho continua sendo e continuará a ser, um dos mais importantes instrumentos de composição dos conflitos decorrentes do trabalho humano e de equilíbrio das relações laborais, pois composta por profissionais com vocação e formação institucional, social e jurídica para essa honrosa missão, o que foi reconhecido pelo constituinte ao erigi-la como órgão do Poder Judiciário responsável pela composição dos conflitos entre o capital e o trabalho.

Nesse quadro, a par do óbice constitucional anteriormente mencionado, seria um terrível equivoco extinguir-se a Justiça do Trabalho, pois isso implicaria na morte do próprio Direito do Trabalho, em manifesta violação à proibição de revogação de preceitos constitucionais marcados pela natureza de cláusulas pétreas e, portanto, fora do alcance do poder de emenda constitucional, além de constituir um lamentável retrocesso social.

Espera-se que o discurso da extinção da Justiça do Trabalho seja revisto não apenas pelo Presidente da República, mas por todos aqueles que eventualmente possam com ele comungar.

* O autor é Desembargador do TRT da 24ª Região