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Educação

Ex-preso no Carandiru, doutor pela USP incentiva internos de MS a se libertarem

05 maio 2019 - 15h43

Exemplo de superação, o especialista em educação prisional Roberto da Silva palestrou para internos do IPCG (Instituto Penal de Campo Grande) e dividiu com os custodiados um pouco da experiência de vida. Após cumprir pena no extinto Carandiru, em São Paulo, ele descobriu na educação a oportunidade de escrever uma nova história, e hoje é professor doutor na USP (Universidade de São Paulo).

A apresentação integrou as ações do projeto de remição pela leitura desenvolvido em presídios de Mato Grosso do Sul por meio de parceria entre a Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário) e a UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). A apresentação foi possibilitada pelo Conselho Regional de Psicologia (CRP-14) que trouxe o especialista a Campo Grande para participar da Conferência Direitos Humanos: Povos Indígenas, Migração, Racismo e Sistema Prisional.

“A leitura te faz descobrir que podem prender o seu corpo, mas não a sua mente. Quando descobri que – pela leitura, reflexão e discussão nas rodas de conversas sobre essas leituras – é possível explorar outros mundos, outros universos, outros significados, isso na verdade significou para mim a verdadeira libertação”, declarou Roberto da Silva aos detentos.

A reflexão do pesquisador é reforçada também pelo interno Teodoro José da Silva, de 53 anos. Ele é um dos participantes do projeto no IPCG desde o ano passado e garante que já leu seis livros neste período. “A leitura nos traz conhecimento e o aprendizado de querer saber o que se passa lá fora também, é um meio de a gente mudar a vida. Os dois primeiros livros que li, minha resenha não foi aprovada, mas não desisti e as outras foram, agora me sinto feliz e capaz, não quero parar mais de ler, e utilizar o conhecimento da leitura para novos caminhos”, afirmou.

Conforme a resolução 44 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), a remição por meio da leitura será de quatro dias na pena, mediante a entrega e aprovação de uma resenha, sendo possível entregar apenas uma por mês, ou seja, cada reeducando poderá ler 12 livros ao ano, obtendo, no máximo, remição de 48 dias no total. Normativa do Tribunal de Justiça do Estado estabelece que a contagem de tempo para fins de remição será feita à razão de quatro dias de pena para cada 30 dias de leitura.

A participação do preso deve ser voluntária, podendo fazer parte os reeducandos capazes de elaborar uma resenha da obra literária lida ou participar de prova aplicada com apoio de professores. O acervo de livros disponibilizados para os presos será composto por obras selecionadas por professores da UFMS, responsáveis por avaliar os trabalhos apresentados pelos condenados, que terão 30 dias para leitura e posteriormente 10 dias para elaboração da resenha.

Segundo a coordenadora da iniciativa pela UFMS, professora doutora Beatriz Xavier, o projeto de remição pela leitura em parceria com a Agepen teve início em 2017 no presídio feminino de Corumbá, envolvendo o corpo acadêmico, depois foi estendido ao IPCG e agora está atingindo outras unidades prisionais da capital. “A experiência tem mostrado que a leitura tem contribuído significativamente com a escrita”, destacou, reforçando que tem exemplos de pessoas que conseguiram iniciar um curso superior.

A professora aponta, no entanto, que uma das dificuldades enfrentadas é o baixo número de voluntários para que se possa realizar as oficinas. “Precisamos de mais gente para participarem dos encontros e da aplicação das resenhas”, disse.

Para o diretor-presidente da Agepen, Aud de Oliveira Chaves, a iniciativa é uma importante oportunidade, já que “o conhecimento proporcionado pela leitura é uma ferramenta capaz de crescimento pessoal e profissional”.

Já a chefe da Divisão de Educação, Rita de Cassia Fonseca Argolo, defende que é um projeto que estimula o aprendizado. “Com a leitura tem a possibilidade também de desenvolver a criatividade, o discurso e buscar novas oportunidades”.

Presente na apresentação, a promotora de justiça Renata Goya reforçou que o Estado tem um trabalho diferenciado de ações de reinserção de pessoas em privação de liberdade e citou que a busca é por iniciativas como o projeto de remição para que se atinja um maior número de custodiados.

A editora-chefe da revista Brasileira de Execução Penal” (R-BEP), do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), a agente de execução federal Eli Torres, também participou da apresentação e fez questão de destacar o compromisso da Agepen com a oferta de educação e de trabalho prisional, fazendo Mato Grosso do Sul referência neste sentido. “Temos penitenciárias em outras partes do Brasil que os presos ficam 24 horas trancados, por que não têm oferta de trabalho nem de estudo. Verificamos que temos dificuldade no Mato Grosso do Sul, mas temos pessoas empenhadas com a pauta educacional e do trabalho”, elogiou.