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Uso de redes sociais pode provocar demissão por justa causa

06 março 2017 - 16h45Por Patrícia Teixeira/G1

Postar informações, opiniões e comentários sobre a empresa ou o empregador em redes sociais pode se transformar em uma "arma" contra o empregado, mesmo que tudo aconteça no perfil e grupos particulares. O alerta vale para as mensagens maldosas "sem filtro", ou seja, com conteúdo depreciativo, vexatório, já que não há como controlar o alcance que uma "simples" postagem pode ter. Em janeiro, um juiz de Campinas (SP) negou o pedido de um profissional que queria reverter a justa causa, após se expressar mal no Whatsapp.

A questão é polêmica. Para o juiz do trabalho Rafael Marques de Setta, da 6ª Vara do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 15ª Região, o funcionário que usa a rede de internet da empresa onde trabalha deve redobrar a atenção em relação ao conteúdo que publica em páginas pessoais. Isso vale tanto para emails corporativos quanto para redes sociais.

"A tendência da jurisprudência é que os emails corporativos podem ser analisados pela empresa, desde que o empregado tenha conhecimento prévio quanto a essa possibilidade. O email pessoal, a tendência é que, mesmo usando a rede da empresa, o email não pode ser acessado pelo empregador", explica o juiz.

No entanto, publicar uma mensagem maldosa em um grupo fechado, mas deixar a página aberta no computador da empresa, mesmo que por engano, gera um risco de algum outro funcionário, ou o próprio empregador, acabar vendo a postagem.

"O que o empregador não pode é violar o acesso. Tudo é o meio que ele obteve essa informação. Se é um acesso irrestrito, se um amigo passou. Não vai ter restrição a isso. [...] Todas as redes sociais podem ter as mesmas consequências do Whatsapp. Se se expressar mal, pode sofre a mesma penalidade", afirma o magistrado.

Efeitos da demissão por justa causa

A demissão por justa causa é a penalidade mais grave que um empregador pode aplicar sobre um funcionário. Permite a rescisão do contrato sem ônus para a empresa. Ou seja, o colaborador demitido não tem direito a receber os valores referentes a aviso prévio, férias proporcionais, multa de 40% sobre o valor depositado no FGTS, e ainda não pode acessar o dinheiro acumulado no FGTS e perde o direito a receber o seguro-desemprego.

Sobre isso, Leonardo Bertanha, advogado e sócio da área Trabalhista da unidade Campinas (SP) da TozziniFreire Advogados, alerta que o funcionário só pode receber uma punição para cada irregularidade. Ou seja, a penalidade máxima não pode ser aplicada se o empregado já foi punido, com suspensão ou advertência, por exemplo, diante de um único fato.

"Sempre que você vai aplicar uma justa causa você pondera inúmeros fatores. Se aquela falta é proporcional, se está adequada ou não para efeito da rescisão. [...] Se teve ciência disso [o fato] há um bom tempo e não fez nada, não pode aplicar a justa causa. A pena tem que ser grave o suficiente, de forma imediata. Se já deu uma suspensão sobre um fato, depois não pode aplicar justa causa, pois só pode ter uma punição sobre um fato", explica o advogado.

Reversão de justa causa negada

Em janeiro deste ano, um profissional de Campinas, demitido por justa causa da empresa onde trabalhava, teve o recurso negado pelo juíz Rafael Setta. O trabalhador queria que a penalidade fosse revertida para que pudesse receber seus direitos. Mas, ele não teve sucesso.

O empregado em questão havia postado mensagens se manifestando contra o uniforme da empresa num grupo de Whatsapp composto por funcionários. Segundo o juiz, o profissional usou xingamentos em relação ao seu superior. Como no grupo havia membros do RH da companhia, as mensagens chegaram ao patrão.

"A gente tem uma falta específica que enseja a justa causa, que é 'ferir a honra do empregador'. Na sentença, diz que ele confessou as palavras que ele disse. Não foi o problema da manifestação, a questão é o limite dessa manifestação. Se faz xingamentos, acho que acaba exagerando e ferindo a honra do superior", conta.

Nesta ação também foram considerados outras informações relativas ao funcionário, que pesavam contra o pedido dele na Justiça.
"Esse empregado tinha um histórico de advertências por outros problemas, de dormir no trabalho e faltas. No depoimento dele, em audiência, ele reconhece tudo o que ele disse, que foi transcrito para a empresa", afirma o juiz.

Reversão de justa causa concedida

Já em outro processo julgado por Setta, a justa causa foi revertida. O funcionário havia apresentado um atestado médico, válido, e postou uma foto no Facebook em uma festa no mesmo dia em que estava de licença. Para o empregador, houve fraude. Mas a Justiça constatou que não.

"A apresentação de um atestado falso dá justa causa, mas como não era falso... A alegação do processo era que a pessoa tinha melhorado e que a festa era no final da tarde e que tinha condições de ir. Ele poderia ter recebido uma advertência pela questão de estar numa festa. Achei que a justa causa era inválida porque o atestado era válido", explica o juiz.

Demissão por quebra de confiança

Setta ressalta que a falta de cuidado com a exposição de opiniões difamatórias relacionadas com a empresa pode gerar, além da visualização indesejada da rede social do colaborador, a quebra de confiança.

"Como não precisa justificar uma demissão, o empregador poderia demitir por quebra de confiança, por exemplo. Dificilmente um empregador poderia tolerar esse tipo de informação", explica.

Uso de celular representa risco

São várias as situações em que o uso do telefone celular pode colocar o emprego de um profissional em risco, e a demissão por justa causa também pode ser adotada. O advogado Leonardo Bertanha lembra do caso de um trabalhador que foi demitido por usar o celular em um local onde o risco de ter uma distração poderia gerar um acidente de trabalho: uma serralheria.

"Foi demitido porque a regra da empresa proíbe o uso do celular em razão das máquinas de corte. As empresas podem e serão responsabilizadas por sequelas, por exemplo. Se o empregado desvia a atenção por causa do telefone e se expõe ao risco, ele pode ser mandado embora por justa causa", explica.

O empregador tem a responsabilidade por lei de divulgar e exigir o cumprimento das regras de segurança e fiscalizar, segundo Bertanha.

A produtividade do funcionário também pode ser afetada devido ao uso excessivo do celular. "Não é uma justa causa de imediato. A prática reiterada desse tipo de conduta é configurada pelo relaxo, pouco caso, falta de comprometimento", ressalta o advogado.

Outro cuidado é em relação ao vazamento de informação sigilosa. Por exemplo, no setor automobilístico, Leonardo lembra que não é permitido circular pela fábrica com celular e tirar fotos. "Dependendo de onde tiver acesso, você guarda segredos da empresa", afirma.

Rede social também traz vantagens


O juiz Rafael Setta ressalta que, apesar dos alertas para o uso da rede social, em muitos casos o registro de mensagens relativas ao trabalho se revertem a favor do funcionário.

"Na grande maioria dos casos, as redes são usadas a favor do trabalhador, como por exemplo para gerar prova de horas extras, se o empregador enviar uma mensagem num grupo de trabalho pedindo um relatório para o dia seguinte. E também de assédio moral, assédio sexual", diz o magistrado.

Processos no TRT-15

O G1 solicitou ao TRT-15 o número de ações trabalhistas envolvendo o uso de redes sociais, seja a favor ou contra o empregado. Mas, o órgão informou que não tem como apurar os dados dos processos com esse nível de detalhamento.

Considerando os processos trabalhistas de todo tipo, segundo dados preliminares da Coordenadoria de Pesquisa e Estatística do TRT-15, ingressaram na 1ª instância da 15ª, em 2016, 345.734 ações na fase de conhecimento. Foram solucionadas 311.076, sendo 126.805 por meio da conciliação, o que corresponde a 40,76%.